quinta-feira, 15 de maio de 2008

O SEGREDO é Cultivar


As pessoas têm fome por resultados. Todos querem uma vida feliz e próspera, mas muito poucos se esforçam para isso acontecer. Todos almejam um alto padrão, mas poucos se propõem a escalar até lá. Tem havido uma venda recorde de livros e vídeos como “O Segredo”, cuja proposta é tornar os nossos sonhos realidade. Isso mostra que as pessoas carecem de meios para conseguir o que querem. Mais que isso, elas estão à procura de fórmulas para a felicidade.

Antes de falarmos sobre o ideal, vejamos como vive a sociedade. Desde a infância, as pessoas crescem num mundo de disputas, ouvindo que têm que ser melhores que os outros. Ouvem que isso pode, que aquilo não pode, que isso é feio, que aquilo é bom. Elas não têm a chance de opinar, pois tudo já passou pelo processo de rotulação de acordo com os padrões sociais. Nossa individualidade é desvalorizada e aprendemos que na vida, tudo já está pronto. O mundo é uma vitrine onde os nossos sonhos estão expostos. O nosso trabalho é ganhar dinheiro, chegar lá e comprar. Inconscientemente, achamos que o trabalho serve para conseguir dinheiro e que o dinheiro serve para adquirirmos o que queremos. Deixamos de participar ativamente do processo natural de causa e efeito.

Em nossa vida capitalista e urbana, o que nos falta é aprendermos a ser bons agricultores. Na ânsia pelo fruto, deixamos de lado o processo do plantio. Na natureza, notamos que existe um ciclo regrado do plantio à colheita. Por mais que queiramos comprar, se não está na época de determinado fruto, não adianta insistir. Se queremos determinado fruto, saibamos que ele é resultado de uma correta seleção. O agricultor seleciona as sementes cujos frutos deseja colher, planta-as em um bom solo e cuida para que sejam bem nutridas. Apesar de ter como objetivo o fruto, ele não se concentra na colheita, mas sim em ser um bom semeador.


Não é assim a mentalidade da sociedade. Ela mantém os olhos no futuro e se esquece de construir o presente. Ela força o resultado ao invés de investir nele. O agricultor sabe que valorizando o presente, o futuro será otimizado. Com uma boa base, o crescimento é conseqüência natural. Só é necessário escolher a matriz de onde virá o fruto e zelar para um bom desenvolvimento.

Precisamos conhecer o processo para atingirmos os resultados. Aprendamos com as árvores: em sua aparente imobilidade, ela consome os nutrientes do ar e do solo, desenvolve seus ramos e se eleva em direção ao céu. Por criar fortes bases e estar bem arraigada ao solo, ela enfrenta as tempestades sem se esquivar. Não adianta querer ser forte se não aprender a ser flexível. Não adianta querer ser comandante se não souber ser um bom soldado. É a humildade que forma a soberania, pois soberania sem humildade se torna tirania. A natureza ensina que os resultados são construídos e não impostos. Só depende do cultivo.

Marco Moura

terça-feira, 13 de maio de 2008

* O POÇO *



Cais, às vezes, afundas
em teu fosso de silêncio,
em teu abismo de orgulhosa cólera,
e mal consegues
voltar, trazendo restos
do que achaste
pelas profunduras da tua existência.

Meu amor, o que encontras
em teu poço fechado?
Algas, pântanos, rochas?
O que vês, de olhos cegos,
rancorosa e ferida?

Não acharás, amor,
no poço em que cais
o que na altura guardo para ti:
um ramo de jasmins todo orvalhado,
um beijo mais profundo que esse abismo.

Não me temas, não caias
de novo em teu rancor.
Sacode a minha palavra que te veio ferir
e deixa que ela voe pela janela aberta.
Ela voltará a ferir-me
sem que tu a dirijas,
porque foi carregada com um instante duro
e esse instante será desarmado em meu peito.

Radiosa me sorri
se minha boca fere.
Não sou um pastor doce
como em contos de fadas,
mas um lenhador que comparte contigo
terras, vento e espinhos das montanhas.

Dá-me amor, me sorri
e me ajuda a ser bom.
Não te firas em mim, seria inútil,
não me firas a mim porque te feres.

PABLO NERUDA
********
FONTE-INTERNET

"Sob as Acácias Floridas"


1
Com Novembro a chiar nestas cigarras
as acácias sangrando suas flores
e um sol afirmativo num céu alto
Espero a tua carta e a minha vida
Uma pausa do tempo em minhas mãos
preenchida
pela contagem das horas
nas cigarras e pétalas caídas.
2
A rua corre larga e sossegada
É a hora de tu vires!
Tu vens (eu sei) na moldura vesperal
com esta luz do passado nas paredes
e este céu de altocúmulos de Dezembro.
Com os estames d'acácia
jogo a vida nas sortes infantis
Antera cai? Não cai? Ela virá? Não vem?
E a cada sorte recuso a evidência
Ela virá? Não vem?
É a hora de chegares!
3
Os aros dos meus óculos te emolduram
ó Vénus de cabelos desfrizados!
Enquanto as minhas mãos, cegas, procuram
o cofre dos teus seis apertados.
Construímos assim a primavera
a negada primavera dos amores:
Pega uma flor d'acácia para a pores
no meu cabelo indómito de fera.
Repara e vê a doce realidade:
os nossos jogos simples e ingénuos!
Esta soalheira vespertina hoje é-nos
bela imagem da nossa felicidade.
4
Cigarreio sem sol neste Dezembro.
E um céu da cor da angústia que me dá
a tua ausência em carne e em pensamento.
Magoa-me o teu rosto que não lembro
e o tau vestido branco táfetá
que voava batido pelo vento.
Se esta vida tão clara e simples fosse
como a imagem fixada desse instante
nenhum mal me faria esta chuva precoce.
Chuva, mãe dos poetas, minha amante,
lava às acácias o sanguíneo canto,
cala a voz das cigarras e o meu pranto!

Autor: Mario Antonio
Poeta Angolano
*.*.*.*.

* FANTASIAS DO DESTINO *




Bailem... bailem fantasias.
Desgarre em vivas cores,
Arranquem de mim os amores.
Matem as minhas alegrias...
Quero-me nos poemas de Dante,
Quero-me louco neste instante...

E tudo isto, porque ela partiu.
Sinto a fúria do mar bramindo,
O sol que me ilumina, já caindo
E no coração, estranho vazio...
Deuses que aconteceu com a ternura,
Será que mereço, tão grande tortura.

Não chores por mim, eu vou
Olhem as flores, esqueçam o perfume
Não há amor, esqueceu até o ciúme
Deste ser que loucamente amou...
Bailem... bailem fantasias,
Matem em mim as alegrias...

Quero e sou... um deus de tristeza.
Roubaram o sol... da minha vida;
Já sem ela... por mim perdida,
Comédia hostil... uma certeza.

(António Zumaia)
Poeta português
*.*.*.*.*.
colaboradora:Gênia.

DO NADA ME TORNEI TUDO



Desse incrível Nada, tornei-me Tudo!
Tornei-me brilho das Estrelas!..
Inspiração dos Poetas ,sem poesia,
Amor dos desamados,
Vida para meus desatinos!..

Larguei meu batel ao léu,
singrei mares de loucura,
forjei esperanças vãs!
Saí a tua procura!..

Sem ti, não viveria, nada teria,
quando tudo almejava !..
Te queria em meus sonhos,
nas noites mal dormidas,
nos eternos descaminhos,
só encontrando o nada!

Fugi, lutei, emergi, saí de mim!
Encontrei o Tudo ,
para me acompanhar no Nada!
Finalmente, disse adeus às Ilusões,
beijei a boca da loucura,
procurando encontrar meu Tudo,
só tendo o Nada!

Ainda uma volta,
no descompasso da vida!
Gritei, clamei por ti!
Finalmente te encontrei!..
Não eras mais a Composição do Nada!
Encontrei minha Composição do Tudo...
E... Fui Feliz!

(Eda Carneiro da Rocha)
*.*.*.*.*.*.
Colaboradora:Denise.

Sem Título...

Morre lentamente: quem não viaja, quem não lê, quem não
ouve música, quem não encontra graça em si mesmo.

Morre lentamente quem destrói o seu amor-próprio, quem
não se deixa ajudar.

Morre lentamente quem se transforma em escravo do
hábito, repetindo todos os dias os mesmos trajetos, quem não muda de marca,
não se arrisca a vestir uma nova cor ou não conversa com quem não
conhece.

Morre lentamente quem faz da televisão o seu guru.

Morre lentamente quem evita uma paixão, quem prefere o
negro sobre o branco e os pontos sobre os "is" em detrimento de um
redemoinho de emoções justamente as que resgatam o brilho dos
olhos, sorrisos dos bocejos, corações aos tropeços e sentimentos.

Morre lentamente quem não vira a mesa quando está infeliz,
quem não arrisca o certo pelo incerto para ir atrás de um
sonho, quem não se permite pelo menos uma vez na vida
fugir dos conselhos sensatos.

Morre lentamente, quem passa os dias queixando-se da
sua má sorte ou da chuva incessante.

Morre lentamente, quem abandona um projeto antes de
iniciá-lo, não pergunta sobre um assunto que desconhece ou não
responde quando lhe indagam sobre algo que sabe.
Morre lentamente... "
PABLO NERUDA
*.*.*.*.

POEMA XVII



"Não te amo como se fosses a rosa de sal,
topázio ou flechas de cravos
que propagam o fogo.

Te amo como se amam
Certas coisas obscuras, secretamente,
Entre a sombra e a alma.

Te amo como a planta que não floresce
e leva dentro de si, oculta,
a luz daquelas flores...

E graças a teu amor
vive escuro em meu corpo o apertado
aroma que ascendeu da terra.

Te amo sem saber como...
nem quando...
nem onde...

Te amo assim diretamente...
sem problemas...
sem orgulho...

Assim te amo
por que não sei amar...
de outra maneira
sendo assim deste modo!

Que não sou
nem és tão perto
que tua mão
sobre o meu peito é minha
tão perto que se fecham
teus olhos com meu sonho..."

PABLO NERUDA Em,
Cem Sonetos de Amor, Pág 23
*.*.*.*..*

* INATINGÍVEL *



O que sou eu, gritei um dia para o infinito
E o meu grito subiu, subiu sempre
Até se diluir na distância.
Um pássaro no alto planou vôo
E mergulhou no espaço.
Eu segui porque tinha que seguir
Com as mãos na boca, em concha
Gritando para o infinito a minha dúvida.

Mas a noite espiava a minha dúvida
E eu me deitei à beira do caminho
Vendo o vulto dos outros que passavam
Na esperança da aurora.
Eu continuo à beira do caminho
Vendo a luz do infinito
Que responde ao peregrino a imensa dúvida.

Eu estou moribundo à beira do caminho.
O dia já passou milhões de vezes
E se aproxima a noite do desfecho.
Morrerei gritando a minha ânsia
Clamando a crueldade do infinito
E os pássaros cantarão quando o dia chegar
E eu já hei de estar morto à beira do caminho.

VINICIUS DE MORAES
Rio de Janeiro, 1933
*.*.*.*.

"O Poeta é o Vigia do Tempo"



“O meu grito é mudo e surdo
A minha palavra, o silêncio.
O silêncio dos meus anseios”
*.*.*.*.*.*

“Apenas sinto e consinto o que não consinto.
Por isso estou lhe escrevendo lágrimas do passado,
com temperos do presente”.
*.*.*.*.*.*

“Se meu destino de rosa fosse
eu seria um mar de flores.
Se meu sorriso de pura fonte fosse,
seria um mundo de amores.”
*.*.*.*..*.*

Apalpei o teu suspiro,
como água de kalandula,
e vejo ainda a tua pureza nos meus dedos.
Ainda assim
continuo apalpando aqui e ali
a cor dos meus olhos silêncio
clamando,chamando a música da alvorada.
.*.*.*.*.

“O meu castigo
é o desterro das minhas idéias,
o desamparo das vozes famintas,
o som do desabafo das desilusões.”

“Abro a janela do paraíso
e vejo as canções graves como elas.
Somente a morte vagueia na melodia,
Melodia triste e célebre,
Como o assobio dos canhões”.


“Os angolanos são diferentes.
Compram armas
e matam angolanos, como eu.
Falam inglês, francês, chinês,
português português e português brasileiro.
Suas mulheres se perfumam em Paris
e compram sapatos italianos,
a carne da Argentina e o arroz da China,
as balas de Washington e os tanques em Moscou.”
(DANIEL FERNANDO SETILA)
*..*.*..*.*

Do Livro, UPONGO - ( UM PRANTO POÉTICO )

Daniel Fernando Setila,nascido em 9 de novembro de 1966 na cidade de Huambo (antiga Nova Lisboa),no centro de Angola,é poeta nato. Dono de uma poesia forte,marcada pelas cicatrizes deixadas em seu corpo,sua alma e em seu coração devido à experiência de sua luta em busca da realização dos sonhos e do mundo de esperança que idealizou construir.
*.*.*.*.*.
Fonte: Sergio Mattos

QUANDO VIER ME VISITAR...

Traga flores,
Muitas delas...

Porém, não me traga apenas flores:
Não se esqueça de juntar a elas
A beleza do seu sorriso,
A ternura do seu olhar,
A força do seu abraço.

O calor dos seus beijos...

Quando vier me visitar,
Traga flores,
Muitas delas...
Mas não esqueça de tirar-lhes
Os espinhos que machucam,
As folhas envelhecidas,
Os galhos secos,

As dores embutidas...

Quando vier me visitar,
Traga flores,
Muitas delas...
Perfumadas, coloridas, alegres:
Todas parecidas com você!

Quando vier me visitar,

Traga você por inteiro...


As flores?

Nem sei se vai precisar!


(Marisa Peres)

Canção do Amor-Perfeito


O tempo seca a beleza.
seca o amor, seca as palavras.
Deixa tudo solto, leve,
desunido para sempre
como as areias nas águas.

O tempo seca a saudade,
seca as lembranças e as lágrimas.
Deixa algum retrato, apenas,
vagando seco e vazio
como estas conchas das praias.

O tempo seca o desejo
e suas velhas batalhas.
Seca o frágil arabesco,
vestígio do musgo humano,
na densa turfa mortuária.

Esperarei pelo tempo
com suas conquistas áridas.
Esperarei que te seque,
não na terra, Amor-Perfeito,
num tempo depois das almas.

Cecilia Meirelles

VALE A PENA!





Abro-me ao novo tempo.

Não me importo se ele trás

lágrimas ou tormentos,

pois se não há vida bela,

belos são os momentos

que hei de levar

da estações dos amores,

que floresceram em primaveras

ainda que em outonais cores,

mas sempre a desfolharem alento.

Vale a pena o instante

onde cabe tanto

em tão pouco espaço,

quem sabe, o de um quarto.

Valem as chegadas

apesar das tristes partidas.

Valem os amores

que como o perfume de flores

de algum modo pousam guirlandas

onde antes haviam dissabores.

Tudo o mar devolve

e um dia o amor maior volve

nas areia brancas da esperança

e, por isso mesmo,

vale a pena ousar

como criança

e se consumir em querer.

Se assim não for,

melhor morrer,

porque mortos já estão

os que em solidão

vivem em reguardos vãos

temendo demais

o que vale a pena viver.


Maria Lucia Victor

* DESTE MODO OU DAQUELE MODO *



Deste modo ou daquele modo.
Conforme calha ou não calha.
Podendo às vezes dizer o que penso,
E outras vezes dizendo-o mal e com misturas,
Vou escrevendo os meus versos sem querer,
Como se escrever não fosse uma cousa feita de gestos,
Como se escrever fosse uma cousa que me acontecesse
Como dar-me o sol de fora.
Procuro dizer o que sinto
Sem pensar em que o sinto.
Procuro encostar as palavras à idéia
E não precisar dum corredor
Do pensamento para as palavras

Nem sempre consigo sentir o que sei que devo sentir.
O meu pensamento só muito devagar atravessa o rio a nado
Porque lhe pesa o fato que os homens o fizeram usar.

Procuro despir-me do que aprendi,
Procuro esquecer-me do modo de lembrar que me ensinaram,
E raspar a tinta com que me pintaram os sentidos,
Desencaixotar as minhas emoções verdadeiras,
Desembrulhar-me e ser eu, não Alberto Caeiro,
Mas um animal humano que a Natureza produziu.

ALBERTO CAIEIRO,
Heterônimo de F.Pessoa
*************

"Extravio"



Onde começo, onde acabo
se o que está dentro
como num círculo cuja
periferia é o centro ?
Estou disperso nas coisas,
nas pessoas, nas gavetas:
de repente encontro ali
partes de mim: risos, vértebras.
Estou desfeito nas nuvens:
vejo do alto a cidade
e em cada esquina um menino,
que sou eu mesmo, a chamar-me.
Extraviei-me no tempo.
Onde estarão meus pedaços ?
Muito se foi com os amigos
que já não ouvem nem falam.
Estou disperso nos vivos,
em seu corpo, em seu olfato,
onde durmo feito aroma
ou voz que também fala.
ah, se somente o presente:
esta manhã, esta sala."

Ferreira Gullar
*************

* A VELHICE *




Olha estas velhas árvores, mais belas
Do que as árvores moças, mais amigas,
Tanto mais belas quanto mais antigas,
Vencedoras da idade e das procelas...

O homem, a fera e o inseto, à sombra delas
Vivem, livres da fome e de fadigas*
E em seus galhos abrigam-se as cantigas
E os amores das aves tagarelas.

Não choremos, amigo, a mocidade!
Envelheçamos rindo. Envelheçamos
Como as árvores fortes envelhecem,

Na glória de alegria e da bondade,
Agasalhando os pássaros nos ramos,
Dando sombra e consolo aos que padecem!

(OLAVO BILAC )
Fonte, Jornal da Poesia
Internet
************

Antoine de Saint-exupéry, ( Eterno !!! )



"Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas.
Se alguém amar uma flor a qual só existe um exemplar
em milhões e milhões de estrelas
isso basta para que seja feliz quando a contempla.

É bem mais difícil julgar a si mesmo que julgar os outros,
se consegues julgar-te bem és um verdadeiro sábio.
...Se tu me cativas minha vida será como cheia de sol,
conhecerei um barulho de passos que será diferente dos outros;
os outros passos me fazem entrar debaixo da terra,
o teu me chamará para fora da toca como se fosse música;
a gente só conhece bem as coisas que cativou.
Os homens não têm mais tempo de conhecer coisa alguma,
compram tudo prontinho nas lojas,
mas como não existem lojas de amigos,
os homens não tem mais amigos.
Se tu queres um amigo,cativa-me
eis o meu segredo é muito simples.
Só se vê bem com o coração
o essencial é invisível para os olhos.
Foi o tempo que perdeste com tua rosa
que fez tua rosa tão importante."

(Saint-Exupéry)
*******************
Do Livro "O Pequeno Príncipe"
Ed.AGIR - de 1977

*A Carlos Drummond de Andrade*



Não há guarda-chuva
contra o poema
subindo de regiões onde tudo é surpresa
como uma flor mesmo num canteiro.

Não há guarda-chuva
contra o amor
que mastiga e cospe como qualquer boca,
que tritura como um desastre.

Não há guarda-chuva
contra o tédio*
o tédio das quatro paredes, das quatro
estações, dos quatro pontos cardeais.

Não há guarda-chuva
contra o mundo
cada dia devorado nos jornais
sob as espécies de papel e tinta.

Não há guarda-chuva
contra o tempo,
rio fluindo sob a casa, correnteza
carregando os dias, os cabelos.

João Cabral de Melo Neto
******************

Texto extraído do livro "João Cabral de Melo Neto
Obra completa",Editora Nova Aguilar
Rio de Janeiro,1994, pág. 79.

* MARIA *



"Tenho cantado esperancas...
Tenho falado d'amores...
Das saudades e dos sonhos
Com que embalo as minhas dores...

Entre os ventos suspirando
Vagas, tenues harmonias,
Tendes visto como correm
Minhas doidas fantasias.

E eu cuidei que era poesia
Todo esse louco sonhar...
Cuidei saber o que e vida
So porque sei delirar...

So porque a noite, dormindo
Ao seio duma visao,
Encontrava algum alivio,
Meu dorido coracao,

Cuidei ser amor aquilo
E ser aquilo viver...
Oh! que sonhos que se abracam
Quando se quer esquecer !

Eram fantasmas que a noite
Trouxe, e o dia ja levou...
A luz d?estranha alvorada
Hoje minha alma acordou !

Esquecei aqueles cantos...
So agora sei falar !
Perdoa-me esses delirios...
So agora soube amar ! "

Antero Tarquínio de Quental
*******************

* TRAJETO *



Na vertigem do oceano
vagueio
sou ave que com seu vôo
se embriaga
Atravesso o reverso do céu
e num instante
eleva-se o meu coração sem peso
Como a desamparada pluma
subo ao reino da inconstância
para alojar a palavra inquieta
na distância que percorro
eu mudo de ser*
permuto de existência
surpreendo os homens
na sua secreta obscuridade
transito por quartos
de cortinados desbotados
e nas calcinadas mãos
que esculpiram o mundo
estremeço como quem desabotoa
a primeira nudez de uma mulher"
Mia Couto
******************
Belíssimo poeta moçambicano

*Se as minhas mãos pudessem desfolhar*



Eu pronuncio teu nome
nas noites escuras,
quando vêm os astros
beber na lua
e dormem nas ramagens
das frondes ocultas.
E eu me sinto oco
de paixão e de música.
Louco relógio que canta
mortas horas antigas.

Eu pronuncio teu nome,
nesta noite escura,
e teu nome me soa
mais distante que nunca.
Mais distante que todas as estrelas
e mais dolente que a mansa chuva.

Amar-te-ei como então
alguma vez? Que culpa
tem meu coração?
Se a névoa se esfuma,
que outra paixão me espera?
Será tranqüila e pura?
Se meus dedos pudessem
desfolhar a LUA!!

(GARCIA LORCA)
FONTE - NET
*****************

*AS MÃOS DE JEANNE-MARIE*



"Jeanne-Marie possui mãos fortes,
Sombrias, que o verão marca.
Mãos pálidas como mãos mortas
- São as mãos de Joana D'Arc?

Conhecem cremes morenos
Sobre sua pele nua?
Teriam afogado luas
Em fundos lagos serenos?

Sorveram o ar de céus bárbaros,
Outrora em calmos instantes?
Ou enrolaram cigarros?
Traficaram diamantes?

Em ardentes pés de Madonas
Fizeram secar as flores?
É o sangue das beladonas
Que as suas palmas colore?

Essas mãos caçam pequenos
Dípteros, de asas azuis,
Que bebem néctar e luz?
Mãos que decantam venenos?

Ah, que sonho as arrebata
Nessa pandiculação?
Um sonho raro da Ásia,
Dos Khenghavars, do Sião?

- Jamais venderam laranjas;
Nem cultuam deuses gregos:
Nem nunca levaram fraldas
De gordos meninos cegos.

Mãos que não são de mimos;
De operária em fundição,
Que acende, ao calor da usina,
Um sol ébrio de alcatrão.

São mãos que se amoldam fáceis
E a ninguém fazem mal.
São mãos fatais como máquinas,
Mais fortes que um animal!

Como fornalhas acesas,
Fazem arder corações.
Sempre entoam Marselhesas,
E nunca rezam orações!

Vosso pescoço, madames,
Apertarão até o fim!
Senhoras de mãos infames
Lambuzadas de carmin.

Mas essas mãos amorosas
São muitas vezes cruéis.
E nas falanges formosas
O sol coloca rubis!

A mancha que o povo deixa
Em seu dorso imaculado
Faz que o homem revoltado
Fervorosamente a beije.

Comovem-se encantadoras
Ao sol de amor carregado;
Ao som de metralhadoras
Através Paris sublevada!

Muita vez, em vossos pulsos
- Mãos sacras que, de ilusões
Os meus lábios embriagam -
Grita o metal dos grilhões!

E é um Sobressalto estranho,
Que nos sacode e dá medo,
Quando ao clarear-vos, mãos de anjo,
Fazem-vos sangrar os dedos!"

ARTHUR RIMBAUD
TRADUZIDO POR FERREIRA GULLAR
*****************

Mude




Mude....

Mas comece devagar,
porque a direção é mais importante
que a velocidade.

Sente-se em outra cadeira,
no outro lado da mesa.
Mais tarde, mude de mesa.

Quando sair,
procure andar pelo outro lado da rua.
Depois, mude de caminho,
ande por outras ruas,
calmamente,
observando com atenção
os lugares por onde
você passa.

Tome outros ônibus.
Mude por uns tempos o estilo das roupas.
Dê os teus sapatos velhos.
Procure andar descalço alguns dias.

Tire uma tarde inteira
para passear livremente na praia,
ou no parque,
e ouvir o canto dos passarinhos.

Veja o mundo de outras perspectivas.
Abra e feche as gavetas
e portas com a mão esquerda.

Durma no outro lado da cama...
depois, procure dormir em outras camas.

Assista a outros programas de tv,
compre outros jornais...
leia outros livros,
Viva outros romances.

Não faça do hábito um estilo de vida.
Ame a novidade.
Durma mais tarde.
Durma mais cedo.

Aprenda uma palavra nova por dia
numa outra língua.
Corrija a postura.
Coma um pouco menos,
escolha comidas diferentes,
novos temperos, novas cores,
novas delícias.

Tente o novo todo dia.
o novo lado,
o novo método,
o novo sabor,
o novo jeito,
o novo prazer,
o novo amor.
a nova vida.

Tente.
Busque novos amigos.
Tente novos amores.
Faça novas relações.

Almoce em outros locais,
vá a outros restaurantes,
tome outro tipo de bebida
compre pão em outra padaria.
Almoce mais cedo,
jante mais tarde ou vice-versa.

Escolha outro mercado...
outra marca de sabonete,
outro creme dental...
tome banho em novos horários.

Use canetas de outras cores.
Vá passear em outros lugares.
Ame muito,
cada vez mais,
de modos diferentes.

Troque de bolsa,
de carteira,
de malas,
troque de carro,
compre novos óculos,
escreva outras poesias.

Jogue os velhos relógios,
quebre delicadamente
esses horrorosos despertadores.

Abra conta em outro banco.


Vá a outros cinemas,
outros cabeleireiros,
outros teatros,
visite novos museus.

Mude.
Lembre-se de que a Vida é uma só.
E pense seriamente em arrumar um outro emprego,
uma nova ocupação,
um trabalho mais light,
mais prazeroso,
mais digno,
mais humano.

Se você não encontrar razões para ser livre,
invente-as.
Seja criativo.

E aproveite para fazer uma viagem despretensiosa,
longa, se possível sem destino.

Experimente coisas novas.
Troque novamente.
Mude, de novo.
Experimente outra vez.

Você certamente conhecerá coisas melhores
e coisas piores do que as já conhecidas,
mas não é isso o que importa.
O mais importante é a mudança,
o movimento,
o dinamismo,
a energia.
Só o que está morto não muda !

"Repito por pura alegria de viver:
a salvação é pelo risco,
sem o qual a vida não vale a pena"
(Clarice Lispector)

domingo, 4 de maio de 2008

ILUSÕES DO AMANHÃ

'Por que eu vivo procurando um motivo de viver,
Se a vida às vezes parece de mim esquecer?
Procuro em todas, mas todas não são você.
Eu quero apenas viver, se não for para mim, que seja pra você.
Mas às vezes você parece me ignorar,
Sem nem ao menos me olhar,
Me machucando pra valer.
Atrás dos meus sonhos eu vou correr.
Eu vou me achar, pra mais tarde em você me perder.
Se a vida dá presente pra cada um, o meu, cadê?
Será que esse mundo tem jeito?
Esse mundo cheio de preconceito.
Quando estou só, preso na minha solidão,
Juntando pedaços de mim que caíam ao chão,
Juro que às vezes nem ao menos sei, quem sou.
Talvez eu seja um tolo, que acredita num sonho.
Na procura de te esquecer, eu fiz brotar a flor.
Para carregar junto ao peito,
E crer que esse mundo ainda tem jeito.
E como príncipe sonhador...
Sou um tolo que acredita, ainda, no amor.'



PRÍNCIPE POETA (Alexandre Lemos - APAE)
Este poema foi escrito por um aluno da APAE, chamado, pela sociedade, de excepcional.
Excepcional é a sua sensibilidade!
Ele tem 28 anos, com idade mental de 15 e peço que divulguem para prestigiá-lo.
Se uma pessoa assim acredita tanto, porque as que se dizem normais não acreditam?
Precisamos repensar muitas coisas.


Poema passado por Valéria Gadioli.

sábado, 3 de maio de 2008

Um Grande Amor...

Um grande amor é aquele q ñ faz seu coração parar no primeiro olhar, e sim acelerar a ponto de parecer q ñ irá mais caber em seu corpo.

Um grande amor é aquele q faz vc se sentir especial, mas no fundo não tão boa o suficiente para ele.

Um grande amor é aquele q vc tem medo e a insegurança de o perder, pois vc ñ se enxerga sem ele.

Um grande amor é aquele q te mata de sdads. Q faz vc se sentir sufocada e presa a uma agonia terrível só pelo fato de ñ se verem a alguns instantes.

Um grande amor é aquele q te faz possessiva. Vc ñ o quer dividir com ninguém. Isso pq, dividindo vc terá q abrir mão dos pequenos instantes q passa ao lado dele, afinal por mais tmpo q fiquem juntos, nunk será o suficiente.

Um grande amor é aquele q vc sente raiva nos momentos de briga, mas essa raiva nunk predomina o amor. Basta vc lembrar do sorriso da pessoa amada, q parece q involuntariamente vc começa a sorrir.

Um grande amor é aquele q faz nossos olhos se encherem de água só de cogitar um adeus.

Um grande amor é aquele q sequestra nossos pensamentos.

Um grande amor é aquele pode ñ ser perfeito, mas aos nossos olhos ele nao apresenta nenhum defeito. Ele é lindo do seu próprio jeito e ninguém se compara a ele.

Um grande amor é aquele q se o machucam, vc se sente ferida por tabela. O defende com toda a garra, pois ninguém no mundo parece ser mais importante.

Um grande amor é aquele q te faz ir contra sua familia, amigos, colegas ... Vc enfrenta o inferno por ele, pois ele é o único q te faz chegar no céu.

Um grande amor é um coisa única q sentimos no coração. Uma mistura de aperto, sufoco, alegria, tristeza e forte pulsação.

Não sei quantos grandes amores podemos ter na vida.
Não sei se grandes amores podem ser substituídos.
Não sei se grandes amores são eternos somente enquanto duram.
Mas, a sensação q esse grande amor te faz sentir é única. E vc sempre a guardará em seu coração, como uma ilusão ou ñ.

By: GRaZzy

* GOSTO QUANDO ME FALAS DE TI *

Gosto quando me falas de ti... e vou te percorrendo
e vou descortinando a tua vida
na paisagem sem nuvens, cenário de meus desejos
[tranqüilos

Gosto quando me falas de ti... e então percebo
que antes mesmo de chegar, me adivinhavas,
que ninguém te tocou, senão o vento
que não deixa vestígios, e se vai
desfeito em carícias vãs...

Gosto quando me falas de ti... quando aos poucos a luz
vasculha todos os cantos de sombra, e eu só te encontro
e te reencontro em teus lábios, apenas pintados,
maduros,
mas nunca mordidos antes da minha audácia.

Gosto quando me falas de ti... e muito mais adiantas
em teus olhos descampados, sem emboscadas,
e acenas a tua alma, sem dobras, como um lençol
distendido,
e descortino o teu destino, como um caminho certo, cuja
primeira curva
foi o nosso encontro.

Gosto quando me falas de ti... porque percebo que te
[desnudas
como uma criança, sem maldade,
e que eu cheguei justamente para acordar tua vida
que se desenrola inútil como um novelo
que nos cai no chão..."

( Poema de JG de Araujo Jorge do
livro "Quatro Damas" 1a ed. 1965 )

*************************

A CANÇÃO DO EXÍLIO

LISBOA - 1855

Eu nasci além dos mares:
Os meus lares,
Meus amores ficam lá !
Onde canta nos retiros
Seus suspiros,
Suspiros o sabiá !
Oh ! que céu, que terra aquela,
Rica e bela
Como o céu de claro anil !
Que selva, que luz, que galas,
Não exalas,
Não exalas, meu Brasil !
Oh ! que saudades tamanhas
Das montanhas,
Daqueles campos natais !
Daquele céu de safira
Que se mira,
Que se mira nos cristais !
Não amo a terra do exílio,
Sou bom filho,
Quero a pátria, o meu país,
Quero a terra das mangueiras
E as palmeiras,
E as palmeiras tão gentis !
Como a ave dos palmares
Pelos ares*
Fugindo do caçador;
Eu vivo longe do ninho,
Sem carinho,
Sem carinho e sem amor !
Debalde eu olho e procuro...
Tudo escuro
Só vejo em roda de mim !
Falta a luz do lar paterno
Doce e terno,
Doce e terno para mim !
Distante do solo amado
Desterrado
A vida não é feliz.
Nessa eterna primavera
Quem me dera,
Quem me dera o meu país !

Primaveras - Casimiro de Abreu
Ed. L&PM - Pag 25
PS.: Eu amo esta poesia.
Adoro Casimiro de Abreu;
leve e romântico!!!


Casimiro de Abreu
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* PRECE *

Senhor, que és o céu e a terra, que és a vida e a morte! O sol és tu e a lua és tu e o vento és tu! Tu és os nossos corpos e as nossas almas e o nosso amor és tu também. Onde nada está tu habitas e onde tudo está - (o teu templo) - eis o teu corpo.

Dá-me alma para te servir e alma para te amar. Dá-me vista para te ver sempre no céu e na terra, ouvidos para te ouvir no vento e no mar, e mãos para trabalhar em teu nome.

Torna-me puro como a água e alto como o céu. Que não haja lama nas estradas dos meus pensamentos nem folhas mortas nas lagoas dos meus propósitos. Faze com que eu saiba amar os outros como irmãos e servir-te como a um pai.

[...]

Minha vida seja digna da tua presença. Meu corpo seja digno da terra, tua cama. Minha alma possa aparecer diante de ti como um filho que volta ao lar.

Torna-me grande como o Sol, para que eu te possa adorar em mim; e torna-me puro como a lua, para que eu te possa rezar em mim; e torna-me claro como o dia para que eu te possa ver sempre em mim e rezar-te e adorar-te.

Senhor, protege-me e ampara-me. Dá-me que eu me sinta teu. Senhor, livra-me de mim.


Fernando Pessoa em "O Eu Profundo".
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*O GUARDADOR DE REBANHOS *

Eu nunca guardei rebanhos,
Mas é como se os guardasse.
Minha alma é como um pastor,
Conhece o vento e o sol
E anda pela mão das Estações
A seguir e a olhar.
Toda a paz da Natureza sem gente
Vem sentar-se a meu lado.
Mas eu fico triste como um pôr de sol
Para a nossa imaginação,
Quando esfria no fundo da planície
E se sente a noite entrada
Como uma borboleta pela janella.

Mas a minha tristeza é socego
Porque é natural e justa
E é o que deve estar na alma
Quando já pensa que existe
E as mãos colhem flores sem ella dar por isso.

Como um ruido de chocalhos
Para além da curva da estrada,
Os meus pensamentos são contentes.
Só tenho pena de saber que elles são contentes,
Porque, se o não soubesse,
Em vez de serem contentes e tristes,
Seriam alegres e contentes.

Pensar incommóda como andar á chuva
Quando o vento cresce e parece que chove mais.

Não tenho ambições nem desejos.
Ser poeta não é uma ambição minha.
E´ a minha maneira de estar sòsinho.

E se desejo ás vezes,
Por imaginar, ser cordeirinho
(Ou ser o rebanho todo
Para andar espalhado por toda a encosta
A ser muita cousa feliz ao mesmo tempo),
E´ só porque sinto o que escrevo ao pôr do sol,
Ou quando uma nuvem passa a mão por cima da luz
E corre um silencio pela herva fóra.

Quando me sento a escrever versos
Ou, passeando pelos caminhos ou pelos atalhos,
Escrevo versos num papel que está no meu pensamento,
Sinto um cajado nas mãos
E vejo um recorte de mim
No cimo d´um outeiro,
Olhando para o meu rebanho e vendo as minhas idéas,
Ou olhando para as minhas idéas e vendo o meu rebanho,
E sorrindo vagamente como quem não comprehende o que se diz
E quer fingir que comprehende.

Saúdo todos os que me lerem,
Tirando-lhes o chapeu largo
Quando me vêem á minha porta
Mal a diligencia levanta no cimo do outeiro.
Saúdo-os e desejo-lhes sol,
E chuva, quando a chuva é precisa,
E que as suas casas tenham
Ao pé dúma janella aberta
Uma cadeira predilecta
Onde se sentem, lendo os meus versos.
E ao lerem os meus versos pensem
Que sou cousa natural -
Por exemplo, a arvore antiga
A´ sombra da qual creanças
Se sentavam com um baque, cansados de brincar,
E limpavam o suor da testa quente
Com a manga do bibe riscado.
Alberto Caieiro,heterônimo de


Fernando Pessoa

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* O TEU RISO *

Tira-me o pão, se quiseres,
tira-me o ar, mas não
me tires o teu riso.

Não me tires a rosa,
a lança que desfolhas,
a água que de súbito
brota da tua alegria,
a repentina onda*
de prata que em ti nasce.

A minha luta é dura e regresso
com os olhos cansados
às vezes por ver
que a terra não muda,
mas ao entrar teu riso
sobe ao céu a procurar-me
e abre-me todas
as portas da vida.

Meu amor, nos momentos
mais escuros solta
o teu riso e se de súbito
vires que o meu sangue mancha
as pedras da rua,*
ri, porque o teu riso
será para as minhas mãos
como uma espada fresca.

À beira do mar, no outono,
teu riso deve erguer
sua cascata de espuma,
e na primavera, amor,
quero teu riso como
a flor que esperava,
a flor azul, a rosa
da minha pátria sonora.

Ri-te da noite,
do dia, da lua,
ri-te das ruas
tortas da ilha,
ri-te deste grosseiro
rapaz que te ama,
mas quando abro
os olhos e os fecho,
quando meus passos vão,
quando voltam meus passos,
nega-me o pão, o ar,
a luz, a primavera,
mas nunca o teu riso,
porque então morrer"



PABLO NERUDA
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Cântico Immran

Não sei qual é o meu destino
Viajo para muito longe das ondas.
Procuro minha alma, onde ela está?
Eu olho e vejo a estrela para me guiar de volta.

Há uma ilha no oeste
Sobre o Sol, sobre o mar,
Viajo para muito longe em minha busca
Procuro um guia para me conduzir.

Um ramo de prata em minha mão
Com flor de cristal e fruto dourado,
A mãe árvore cresce na praia,
É lá que eu devo encontrar minha raiz.

Há uma ilha no mar,
Onde as águas fluem o alimento da vida,
Onde não há inimigo, onde o amor é livre.
Procuro o lugar onde não há contenda.

Eu olho a estrela para me guiar para casa,
Encontro o repouso da minha alma e meu espírito,
Viajei muito além das ondas.
Não há fim em minha busca.

(Caitlin Matthews)

* RETRATO EM LUAR *



Meus olhos ficam neste parque,
minhas mãos no musgo dos muros,
para o que um dia vier buscar-me,
entre pensamentos futuros.

Não quero pronunciar teu nome,
que a voz é o apelido do vento,
e os graus da esfera me consomem
toda, no mais simples momento.

São mais duráveis a hera, as malvas,
que a minha face deste instante.
Mas posso deixá-la em palavras,
gravada num tempo constante.

Nunca tive os olhos tão claros
e o sorriso em tanta loucura.
Sinto-me toda igual às árvores:
solitária, perfeita e pura.

Aqui estão meus olhos nas flores,
meus braços ao longo dos ramos:
e, no vago rumor das fontes,
uma voz de amor que sonhamos.

(CECÍLIA MEIRELES) Pág.32
Do Livro:Retrato Natural - 1949
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Não sou areia

Não sou areia
onde se desenha um par de asas
ou grades diante de uma janela.
não sou apenas a pedra que rola
na marés do mundo,
em cada praia renascendo outra.
Sou a orelha encostada na concha
da vida, sou construção e desmoronamento,
servo e senhor, e sou
mistério.

A quatro mãos escrevemos o roteiro
para o palco de meu tempo:
o meu destino e eu.
Nem sempre estamos afinados,
nem sempre nos levamos
a sério.

Lya Luft

É Proibido

Pablo Neruda

É proibido chorar sem aprender,
Levantar-se um dia sem saber o que fazer
Ter medo de suas lembranças.

É proibido não rir dos problemas
Não lutar pelo que se quer,
Abandonar tudo por medo,
Não transformar sonhos em realidade.

É proibido não demonstrar amor
Fazer com que alguém pague por tuas dúvidas e mau-humor.

É proibido deixar os amigos
Não tentar compreender o que viveram juntos
Chamá-los somente quando necessita deles.

É proibido não ser você mesmo diante das pessoas,
Fingir que elas não te importam,
Ser gentil só para que se lembrem de você,
Esquecer aqueles que gostam de você.

É proibido não fazer as coisas por si mesmo,
Não crer em Deus e fazer seu destino,
Ter medo da vida e de seus compromissos,
Não viver cada dia como se fosse um último suspiro.

É proibido sentir saudades de alguém sem se alegrar,
Esquecer seus olhos, seu sorriso, só porque seus caminhos se desencontraram,
Esquecer seu passado e pagá-lo com seu presente.

É proibido não tentar compreender as pessoas,
Pensar que as vidas deles valem mais que a sua,
Não saber que cada um tem seu caminho e sua sorte.

É proibido não criar sua história,
Deixar de dar graças a Deus por sua vida,
Não ter um momento para quem necessita de você,
Não compreender que o que a vida te dá, também te tira.

É proibido não buscar a felicidade,
Não viver sua vida com uma atitude positiva,
Não pensar que podemos ser melhores,
Não sentir que sem você este mundo não seria igual.

Eu me chamo Vida....

Inês Marucci


Sou jardim ornado em flor,
daquela que geme de amor
que chove orvalho em pingo,
um jardim do perfume antigo
arejando a doce brisa no mar,
para toda a fantasia navegar.

Sou uma vida a te encantar
cheia de areias que andam
sob luz de estrelas a cintilar.
Digo não que pode ser sim,
meus olhos são o teu farol
a guiar na direção do sol.

Sou a mão firme que abraça
revigorando teu doce sono,
ponho amor na tua cabeça;
torno o desafio mais ameno
porque sou a estrela criança
que brinca alegre ao sereno.

Sou os teus pés a caminharem,
descobrindo as primaveras
ao lado de pássaros a voarem.
Sou brisa mansa que tant'esperas
par'os pensamentos desembaraçar
sou eu a VIDA de muitas quimeras!

Assombro

Henriqueta Lisboa

Século de assombro - este século.
De violência em progresso.
E os outros séculos?
Cada ser ao sentir o peso do mundo
não terá dito: século de assombro?

O assombro seca a própria sombra
de tanto secar existência:

Sequidão de corações e mentes
Secura de corpo nos ossos
Legião de cegos e de inaptos
Asfixia de túneis e masmorras
Mantos e esgares de hipocrisia
Sevícia para fins de anuência
Acúmulo de monstros e monturos
— Assombro à cunha.

Porém acima de qualquer assombro
aquele assombro vindo de antanho
para atravessar o século
de ponta a ponta — flecha escusa — e ser
perene assombro dos mortais
— a morte.

MAIOR TORTURA

Florbela Espanca

Sou a sombra profunda dos espaços
Eu sou a dor de um pobre enlouquecido
Ergo aos céus mudos meus braços
E o céu é sempre azul e sempre nudo.

À Terra não me prendem nenhuns laços
Perco-me em mim na dor de ter vivido!
E não tenho a doçura duns abraços
Que me façam sorrir de ter nascido!

Sou como tu, um cardo desprezado,
A urza que se pisa sob os pés,
Sou como tu, um riso desgraçado!

Mas a minha Tortura ainda é maior:
Não ser poeta, assim como tu és
Para falar assim da minha Dor!

* MEUS JULHOS *


Sou julho,
estou explicado só pelo sol

Meu erro
é procurar um território
apto a nascer

A única geografia
que me aceita é a poesia

Como a chuva
que repousa entre nuvem e terra
me escrevo*
na ausência de todas as línguas

Me esqueço-me:
só me falto eu
para ficar todo só

Antes de nascer
já eu tinha envelhecido tudo

Por isso,
não me espanta
o casal de pedras
nem a árvore que engravidou

Minha doença,
felizmente,
é muito miraculável.

Mia Couto
julho de 1989

Em "Raiz de Orvalho e Outros Poemas"
editorial Caminho,Pág. 67

"Mia Couto nasceu na Beira,Moçambique,em 1955.Foi director da Agência de Informação de Moçambique,da revista Tempo e do jornal Notícias de Maputo.Tornou-se nestes últimos anos um dos ficcionistas mais conhecidos das literaturas de língua portuguesa. O seu trabalho sobre a língua permite-lhe obter uma grande expressividade,por meio da qual comunica aos leitores todo o drama da vida em Moçambique após a independência.Os seus livros estão traduzidos nomeadamente em francês, inglês,alemão, italiano e espanhol."
********************************************************************

* MEU DESEJO *


Meu desejo? Era ser a luva branca
Que essa tua gentil mãozinha aperta;
A camélia que murcha no teu seio,
O anjo que por te ver do céu deserta...
Meu desejo? Era ser o sapatinho
Que teu mimoso pé no baile encerra...
A esperança que sonhas no futuro,
As saudades que tens aqui na terra...
Meu desejo? Era ser o cortinado
Que não conta os mistérios de teu leito;
Era de teu colar de negra seda
Ser a cruz com que dormes sobre o peito.
Meu desejo? Era ser o teu espelho
Que mais bela te vê quando deslaças
Do baile as roupas de escomilha e flores
E mira-te amoroso as nuas graças!
Meu desejo? Era ser desse teu leito
De cambraia o lençol, o travesseiro
Com que velas o seio, onde repousas,
Solto o cabelo, o rosto feiticeiro...
Meu desejo? Era ser a voz da terra
Que da estrela do céu ouvisse amor!
Ser o amante que sonhas, que desejas
Nas cismas encantadas de langor!
(ÁLVARES DE AZEVEDO)
EM "A LIRA DOS VINTE ANOS" - 3ªparte
PÁG.38 DE 76 PÁGINAS.
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CANÇÃO PARA UMA VALSA LENTA

Mário Quintana






"Minha vida não foi um romance...
Nunca tive até hoje um segredo.
Se me amas, não digas, que morro
De surpresa... de encanto... de medo...

Minha vida não foi um romance,
Minha vida passou por passar.
Se não amas, não finjas, que vivo
Esperando um amor para amar.

Minha vida não foi um romance...
Pobre vida... passou sem enredo...
Glória a ti que me enches a vida
De surpresa, de encanto, de medo!

Minha vida não foi um romance...
Ai de mim... já se ia acabar!
Pobre vida que toda depende
De um sorriso... de um gesto... um olhar..."

Em "Antologia Poética" -
Coleção Prestígio, Ed. Ediouro, 1995
SEGUEM AS HOMENAGENS À QUINTANA
PELO SEU CENTANÁRIO,COMPLETADOS EM
30 de julho de 2006

* VERSOS DE ORGULHO *



"O mundo quer-me mal porque ninguém
Tem asas como eu tenho ! Porque Deus
Me fez nascer Princesa entre plebeus
Numa torre de orgulho e de desdém.

Porque o meu Reino fica para além ...
Porque trago no olhar os vastos céus
E os oiros e clarões são todos meus !
Porque eu sou Eu e porque Eu sou Alguém !

O mundo ? O que é o mundo, ó meu Amor ?
__O jardim dos meus versos todo em flor ...
A seara dos teus beijos, pão bendito ...

Meus êxtases, meus sonhos, meus cansaços ...
__São os teus braços dentro dos meus braços,
Via Láctea fechando o Infinito."

(FLORBELA ESPANCA)- (1894-1930)
Do livro Charneca em Flor-Pag.58
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AMAR: VERBO INTRANSITIVO

Carlos Drummond de Andrade


Quando encontrar alguém e esse alguém fizer seu coração parar de funcionar por alguns segundos, preste atenção: pode ser a pessoa mais importante da sua vida.

Se os olhares se cruzarem e, neste momento, houver o mesmo brilho intenso entre eles, fique alerta: pode ser a pessoa que você está esperando desde o dia em que nasceu.

Se o toque dos lábios for intenso, se o beijo for apaixonante, e os olhos se encherem d'água neste momento, perceba: existe algo mágico entre vocês.

Se o primeiro e o último pensamento do seu dia for essa pessoa, se a vontade de ficar juntos chegar a apertar o coração, agradeça: Deus te mandou um presente divino - o amor.

Se um dia tiverem que pedir perdão um ao outro por algum motivo e em troca receber um abraço, um sorriso, um afago nos cabelos e os gestos valerem mais que mil palavras, entregue-se: vocês foram feitos um pro outro.

Se por algum motivo você estiver triste, se a vida te deu uma rasteira e a outra pessoa sofrer o seu sofrimento, chorar as suas lágrimas e enxugá-las com ternura, que coisa maravilhosa: você poderá contar com ela em qualquer momento de sua vida.

Se você conseguir, em pensamento, sentir o cheiro da pessoa como se ela estivesse ali do seu lado...

Se você achar a pessoa maravilhosamente linda, mesmo ela estando de pijamas velhos, chinelos de dedo e cabelos emaranhados...

Se você não consegue trabalhar direito o dia todo, ansioso pelo encontro que está marcado para a noite...

Se você não consegue imaginar, de maneira nenhuma, um futuro sem a pessoa ao seu lado...

Se você tiver a certeza que vai ver a outra envelhecendo e, mesmo assim, tiver a convicção que vai continuar sendo louco por ela...

Se você preferir morrer, antes de ver a outra partindo: é o amor que chegou na sua vida. É uma dádiva.

Muitas pessoas apaixonam-se muitas vezes na vida, mas poucas amam ou encontram um amor verdadeiro. Ou às vezes encontram e, por não prestarem atenção nesses sinais, deixam o amor passar, sem deixa-lo acontecer verdadeiramente. É o livre-arbítrio. Por isso, preste atenção nos sinais.

Não deixe que as loucuras do dia-a-dia o deixem cego para a melhor coisa da vida: o amor